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Segundo pesquisa, as mudanças climáticas podem resultar na perda de até 99% das espécies de plantas na Caatinga.

Uma pesquisa inovadora conduzida por pesquisadores de diversas universidades brasileiras analisou minuciosamente 420 mil registros de ocorrência que abrangem 3.060 espécies de plantas na região da Caatinga. O estudo revelou que até o ano de 2060, é esperada a perda de espécies em cerca de 99% das comunidades vegetais, resultando em uma simplificação da composição de tipos de plantas em aproximadamente 40% do bioma.

Apesar de a Caatinga ser um ecossistema onde se presume que suas espécies estejam adaptadas às condições climáticas extremas, a pesquisa demonstrou que este bioma é muito mais vulnerável às mudanças climáticas do que se acreditava anteriormente.

A equipe de cientistas compilou dados de variadas coleções científicas, incluindo informações de herbários e literatura especializada, para estabelecer um banco de dados sem precedentes com 420 mil registros de ocorrência referentes a 3.060 espécies vegetais do bioma. Esses dados foram complementados com informações sobre o tipo de crescimento de cada espécie, como se são árvores, arbustos, ervas, suculentas, trepadeiras, ou herbáceas, entre outros.

A próxima etapa envolveu a construção de modelos estatísticos e o uso de inteligência artificial para mapear a distribuição geográfica das plantas na Caatinga, tanto para o presente quanto para cenários futuros baseados em diferentes projeções de mudanças climáticas. Essa abordagem permitiu obter resultados que são uma média ponderada das diferentes previsões climáticas, proporcionando uma visão mais precisa da situação.

Diante desses resultados preocupantes, torna-se ainda mais evidente a necessidade urgente de proteger as áreas mais sensíveis da Caatinga e restaurar a conectividade entre os fragmentos de vegetação, visto que atualmente menos de 9% do bioma está sob a proteção de Unidades de Conservação. A pesquisa destaca a importância de direcionar esforços para a conservação deste ecossistema tropical seco e quente, que é muitas vezes ofuscado pelas preocupações em torno das florestas úmidas tropicais, como a Amazônia.

De acordo com o pesquisador, ao consolidar essas projeções para todas as espécies, é possível avaliar o impacto das mudanças climáticas na diversidade, composição e estrutura das comunidades de plantas. A diversidade refere-se à quantidade de espécies presentes no ambiente, enquanto a composição diz respeito às espécies específicas que fazem parte dessa comunidade. A estrutura, por sua vez, abrange a proporção de diferentes formas de crescimento das plantas, ou seja, se há predominância de espécies arbóreas ou não-arbóreas.

Moura destaca que, de maneira geral, as mudanças climáticas tendem a provocar a substituição de espécies arbóreas e raras por espécies não-arbóreas e generalistas, ou seja, aquelas capazes de prosperar em várias regiões do bioma. Essa transformação na estrutura da vegetação pode ter como consequência a diminuição de serviços ecossistêmicos essenciais, como a produção de biomassa vegetal e o armazenamento de carbono.

Ele explica que durante o processo de fotossíntese, as plantas capturam carbono da atmosfera, o que permite o crescimento de galhos, raízes e folhas, ao mesmo tempo em que liberam oxigênio. Esses serviços ecossistêmicos são conhecidos como armazenamento e sequestro de carbono. A redução da quantidade de árvores na Caatinga resultaria em uma diminuição desses serviços, agravando ainda mais a crise climática.

De acordo com o biólogo Daniel de Paiva Silva, os resultados obtidos são altamente preocupantes quando se trata das mudanças climáticas. Ele observa que, naturalmente, as espécies da Caatinga estão adaptadas às condições climáticas extremas que caracterizam esse bioma. No entanto, o fato de essas espécies, que em teoria seriam mais resistentes e adaptadas a temperaturas e climas extremos, apresentarem perdas significativas levanta uma preocupação maior em relação a outras comunidades de plantas presentes em biomas diferentes. Estas, embora também sejam afetadas pelas mudanças climáticas, não possuem a mesma adaptação a climas extremos como as da Caatinga.

Em resumo,  mesmo sendo um bioma com espécies teoricamente adaptadas a condições climáticas extremas, a Caatinga é mais vulnerável às mudanças climáticas do que se supunha anteriormente. Isso levanta sérias preocupações em relação a outros biomas brasileiros, como a Amazônia, Mata Atlântica e Pantanal, onde as condições climáticas são mais amenas e as plantas não estão preparadas ou adaptadas ao aquecimento global.

Segundo Moura, uma característica distintiva do modelo criado pela equipe é a sua abordagem abrangente para proporcionar projeções robustas. Isso inclui esforços para minimizar incertezas nas projeções climáticas, superar limitações na dispersão das espécies e garantir a aplicabilidade dessas projeções em cenários futuros. Ele explica que a metodologia empregada sintetiza mais de 1 milhão de projeções que consideram as possíveis respostas das 3.060 espécies de plantas às mudanças climáticas. O objetivo é fornecer projeções mais precisas, acompanhadas das incertezas associadas, para identificar as áreas onde as previsões são mais sólidas.

Por outro lado, a bióloga e zoóloga Thaís Guedes, da Unicamp, que não participou da equipe de pesquisa, ressalta que os resultados deste estudo representam um alerta adicional para a necessidade de ações sérias e de planejamento a longo prazo por parte dos governantes e da sociedade em relação às mudanças climáticas e à conservação das florestas tropicais secas da Caatinga. Ela enfatiza que os resultados destacam a urgência de implementar medidas eficazes para a conservação da biodiversidade brasileira em um mundo em constante mudança, seja devido aos impactos das mudanças climáticas ou devido a diversas outras atividades humanas, como mineração, agricultura e incêndios florestais.

Guedes também destaca outro aspecto importante. Ela observa que, embora o estudo tenha se concentrado em plantas, os resultados indicam que a paisagem sofrerá uma transformação significativa, tornando-se mais homogênea e perdendo sua heterogeneidade. Como zoóloga especializada no estudo de répteis e anfíbios na região, ela recebe essas descobertas com grande preocupação, pois a uniformização da vegetação pode desencadear um efeito cascata, resultando na perda de espécies da fauna.

Consequentemente, conforme Moura aponta, os resultados do estudo enfatizam a importância crítica de proteger áreas ecologicamente sensíveis e restaurar a conectividade entre os fragmentos de vegetação para fortalecer a resiliência dos ecossistemas da Caatinga. Ele ressalta que políticas de conservação e manejo florestal que envolvam níveis de governo municipais, estaduais e federais são urgentes. Além disso, a participação ativa das comunidades locais e de todas as partes interessadas que dependem dos recursos da Caatinga é essencial para o êxito dessas iniciativas. É importante notar que a Caatinga é um dos biomas menos protegidos do Brasil, com menos de 9% de sua área amparada por Unidades de Conservação.

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